Tituba Indian (Tituba Índia) era
o nome pelo qual era conhecida, porque ela parece ter sido casada com um homem
escravizado junto dela, em Barbados; Seu nome era John Indian (João Índio). No
entanto, há registros de que Tituba negava ser casada com ele.
Como mulher escravizada por
Samuel Parris, Tituba cuidava da casa, das crianças, dos animais, dentre muitas
tarefas. Sabemos que, ela foi a primeira pessoa a ser interrogada por ocasião
das investigações sobre bruxaria, em 1692. Os registros mostram uma história de
mentiras, histeria e superstição. E a historiografia não mostra, escancara, a
face do preconceito e racismo. Vamos lá...
Pelos registros, sabemos que a
filha de Parris e outras amigas começaram a adoecer, sem uma razão aparente.
Bem, pelo menos não que o médico da família pudesse diagnosticar. Então, ele
alegou que, sem saber a causa do adoecimento, elas só podiam estar sob o
feitiço de alguma bruxa. Naquela altura, Salem (e não só Salem) já era um
enorme celeiro de superstições e a sanha de perseguição a bruxas era lugar
comum. Tanto é que, segundo registros históricos, foi uma vizinha dos Parris,
Mary Sibley, que teria ensinado Tituba a fazer um “bolo de bruxa”, uma espécie
de bolo feito com a urina das meninas que, quando dado a um cachorro, esse
revelaria quem era a bruxa. Mary Sibley não fora condenada a nada, exceto a um
afastamento temporário da congregação, já que era uma figura importante daquela
sociedade, além, obviamente, de ser uma pessoa branca.
Já Tituba...
Tituba foi presa e interrogada
não só por esse fato, mas também por ter sido acusada por Betty Parris e
Abigail Williams que, à altura, estavam apenas começando o enorme trabalho de
manipulação e mentiras que culminou na prisão e morte de inúmeras pessoas. As
três primeiras pessoas acusadas por bruxaria foram três mulheres, claro, que
não se encaixavam nos moldes puritanos da Vila de Salem. Uma delas, por óbvio,
foi Tituba, que era conhecida pelas histórias de sua terra longínqua e, segundo
registros, ela seria conhecida por utilizar plantas para cura e outros
objetivos, tendo, inclusive, muitas vezes, tratado as crianças da Vila,
inclusive as de Parris, com seus remédios naturais. É claro que isso foi usado
como prova de que Tituba era uma bruxa, na concepção diabólica criada à época.
Mas não foi só isso.
Existem dúvidas sobre a etnia de
Tituba, não sabendo se ela seria nativo americana, se seria africana, se seria
mestiça. E isso é um ponto importante em toda a história de Tituba. Ao analisar
uma história, é bom sempre atentarmos ao que não é dito, porque é exatamente
naquilo que não é dito que muita verdade pode ser encontrada.
É o que temos.
E, embora a gente deseje muito
mais, é suficiente para compreendermos a força, a inteligência de Tituba. Como
uma mulher escravizada não branca, portanto, sem recursos, sem proteção,
conseguiu sair viva nessa circunstância? Foi a magia de Tituba que a salvou?
Definitivamente sim. Tituba é definitivamente uma bruxa e devemos honrá-la em
nossos festivais dos mortos, como uma grande ancestral de todas as bruxas. Tituba
é uma bruxa por que não só de feitiços se vive. Ser bruxa é sobre ser
resistência, é sobre ser forte. E ser uma bruxa não branca é, além de tudo
isso, sobre ser sobrevivente.
As imagens que vocês estão vendo,
em desenho, são do século XIX, feitas por John W. Ehninger, que retratou Tituba
com traços que me lembram muito os nativos norte americanos. Ehninger talvez tenha
sido influenciado pela presença dos povos que viviam em Salem, à época de
Tituba. É sabido que os colonos estavam em guerra contra os indígenas da região,
especialmente as etnias Wampanoag, Nipmuck, Pocumtuck e Narragansett. Segundo
avaliação de Sherri V. Cummings, em seu artigo Indian, Mixed, or African: The
Metamorphosis of Tituba, Woman, Slave and Witch of Salem — A Historiographical
Examination, a falta de interesse em registrar a etnia de Tituba é clara e,
infelizmente, lugar comum na época, por isso, é possível que ela tenha sido uma
pessoa mestiça. Acrescento que ela pode ter sido uma mulher com traços muitos
familiares para nós, já que temos uma mistura muito comum de muitos povos.
Olhar para nós mesmos é olhar a história de oprimidos e opressores que se
mesclam em nosso DNA. Sim, somos a soma de muitas histórias de oprimidos e
opressores. Temos todos eles dentro de nós.
Uma dica muito bonita de leitura,
que traz essa reflexão, já que apresenta Tituba como tendo nascida do estupro
de um oficial inglês sofrido por sua mãe, africana, é o romance histórico “Eu,
Tituba, de Maryse Condé”. O livro é narrado pela própria protagonista, e mescla
elementos históricos e ficcionais, num recontar maravilhoso, que nos apresenta
Tituba em muitas épocas de sua vida, proporcionando um sentido de
representatividade muito importante. Recomendo.
Lua Serena
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