Antiga... antiga religião, antiga
prática de fazer poções, Bruxaria, Wicca, Bruxaria Tradicional, Bruxaria
Moderna... Não importa para o nosso papo aqui que definição queiramos dar para
a prática da Bruxaria. O fato é que hoje as antigas práticas da bruxa se
mesclam com a era digital. Difícil ver uma bruxa nos dias de hoje sem celular,
notebook, tablet, enfim... Vivemos num mundo cuja tecnologia é o caminho para
nos aproximar daquilo que é antigo, tradicional. Isso se comprova com
facilidade.
Pergunte-se de onde você conheceu
pessoas da Bruxaria. Pergunte-se aonde você vai para aprender sobre Bruxaria.
Eu garanto que boa parte de vocês conheceu praticantes na internet e quando
quer saber algo é na internet que você vai buscar. Aliás, você está lendo este
artigo por causa da internet!
Pois é, hoje em dia a internet é
o grande canal da comunidade pagã, onde se aprende, onde se conhece gente...
onde, para muitos, inicia-se a descoberta do caminho sacerdotal. Sim, para
muitas vertentes da Bruxaria que a encaram como uma religião sacerdotal, como
por exemplo, a Wicca, os seus adeptos passam por um longo caminho rumo ao
sacerdócio. A esse caminho damos o nome mais comum de Dedicação. Durante a
dedicação inicia-se o processo iniciático de uma pessoa dentro dos mistérios da
Bruxaria.
Esses mistérios são encontrados
no mundo, na vida, em outras religiões? Sim, mas com nuances diferentes,
enfoques diferentes. Mesmo dentro da Bruxaria, o acesso aos mistérios tem suas
particularidades de acordo com o caminho ao qual você pertence. Se você faz
parte de um grupo, de uma tradição, se é solitário, enfim, existem muitos
caminhos e cada qual tem sua peculiaridade. No entanto, os mistérios são os
mistérios e estão aqui, lá, em toda parte... quem tiver olhos que enxergue.
E o que isso tudo tem a ver com a
era digital?
Bem, deixemos os solitários de
lado por hora. Não por menosprezo, de modo algum! Mas por que meu foco hoje é
falar dos treinamentos sacerdotais que se desenvolvem pela internet. Isso é
possível? Como seria isso?
Eu comecei falando que o moderno,
o tecnológico nos abre as portas do antigo, do tradicional. Através do novo,
acessamos o velho, sim. Mas se nos remetermos aos primórdios da Bruxaria... Ok,
nem precisamos ir aos primórdios. Vamos ao período medieval. As bruxas sempre
foram mulheres fora de seu tempo, modernas dentro das possibilidades que seu
tempo permitia. Caldeirão? Se já existisse panela elétrica, com certeza seria
uma dessas que usaríamos em nossos ritos! Sim, as bruxas sempre foram
moderninhas! E por isso mesmo, não me espanta o fato de a Bruxaria ter como
ponto de proliferação a internet. Quantos bruxos e bruxas você conhece que
entendem de fazer sites, de navegar nas redes sociais? Quantos são ótimos em
desenho digital, trabalham com internet? Quantos vídeos falando sobre Bruxaria
você já viu no Youtube? Sites, grupos, comunidades, fanpages, blogs, vlogs,
podcasts... Aposto que você vai achar um número razoável de pessoas que
desenvolve algum trabalho de Bruxaria ligado a um ou mais desses conceitos.
Então esse é o nosso mundo, essa
é a nossa realidade. E se assim é, já podemos ampliar os horizontes de treinar
pessoas on line? Podemos dedicar pessoas on line? Podemos iniciar pessoas on
line? Bem, aí esbarramos numa questão complexa. Até onde podemos ir? Até onde
devemos ir?
Podemos orientar pessoas pela
internet. Muitos desempenham essa função e é maravilhoso. Eu diria até mesmo
que é possível treinar alguém via internet, mas nem tudo dá para ser feito à
distância. Certas coisas, certos rituais precisam ser presenciais.
Por exemplo, uma pessoa que
treina alguém pela internet, sem qualquer rito de marcação desse momento,
passando a dar as orientações com base em sua experiência, mas sem vínculo
espiritual é tão somente uma orientadora. No caso, a pessoa que está sendo
orientada será, se assim for o caso, uma autoiniciada.
Orientar uma pessoa é diferente
de dedicar uma pessoa.
Um dedicado e um dedicador já
estabelecem um laço espiritual que vai se fortalecendo (ou não) com o decorrer
do treinamento e que se consolida com a entrada do dedicado naquilo que
chamamos de estado iniciático, momento em que ocorre a iniciação e a entrada
efetiva daquela pessoa na família espiritual do dedicador/iniciador. É um
nascimento com vínculos fortíssimos entre o iniciador e o iniciado. E também
entre os irmãos e irmãs daquela família.
Agora, orientar uma pessoa é
falar o que ela tem que estudar, é dar um norte para onde tem que ir, num nível
formal, sem qualquer vínculo espiritual. Mesmo que a pessoa que orienta tenha
"olhos" para enxergar o momento em que aquela pessoa está preparada
para se iniciar, ela não é nem o dedicador e nem o iniciador dessa pessoa, mas
apenas um orientador.
Os laços da dedicação (e ainda
mais após a iniciação) são laços muito profundos. E o trabalho de um sacerdote
como instrumento dos Deuses no moldar de um dedicado ou iniciado vai muito além
de mostrar o caminho do que se tem que estudar, quando e como se tem que
estudar.
Sendo assim, pode acontecer
dedicação à distância? Pode sim, só que essa distância não pode ser total. É
preciso que haja certa periodicidade de encontros, participação em certos ritos
junto com o dedicador... e, por óbvio, o rito de iniciação é presencial. Não
tem como ser diferente disso. Até mesmo por todo o processo antes, durante e
depois do ritual. A dedicação de uma pessoa, nem sempre leva a mesma a entrar
na sua família mágica... muitos param durante a dedicação. E a orientação menos
ainda.
Podemos dizer então que temos:
Dedicação: aquela em que o
postulante vai aprender tudo com base no que foi aprendido pelo sacerdote, pelo
coven ou tradição. A dedicação é a "pré entrada" de uma pessoa dentro
de uma egrégora, dentro de um sistema mágico que envolve aquele sacerdote,
aquele grupo, por isso tem um rito próprio que marca o início desse período de
preparação e treinamento. Após esse período, o postulante passa a fazer parte
efetivamente da família espiritual do sacerdote, que é seu coven ou tradição,
tendo acesso a ritos e mistérios que são fechados e que apenas iniciados
daquele grupo têm acesso.
Orientação: é mostrar o que o
postulante deve aprender, ajudar com dúvidas, trocando ideias. Se o sacerdote
tem um grupo (coven ou tradição), ele já tem o material litúrgico daquele
grupo, e nesse tipo de orientação, geralmente, o orientado não tem acesso a
esse material. Pode ter acesso a ensinamentos obviamente vividos pelo
orientador, mas não à liturgia própria do grupo ao qual o sacerdote pertence.
Não há rito de entrada, não há vínculo espiritual, não há orientação no sentido
de auxiliar o orientando na inserção dos mistérios dentro dos preceitos vividos
pelo orientador.
Olhando para trás, penso em como
tudo se transforma e de como de fato somos os moldadores, os co-criadores de
nossa realidade, junto dos Deuses.
Antes tínhamos os bruxos
solitários ou de família. A Bruxaria se desenvolveu primordialmente nesse meio,
tanto que até hoje temos a tendência de chamar de irmãos, filhos, netos, as
pessoas que fazem parte de nosso grupo, de nossa tradição. É um resquício de um
passado longínquo, mas que, de certo modo, ainda está presente e vivo em nossas
vidas. Quando fazemos parte de uma verdadeira família espiritual entendemos
isso e outras coisas. É um reencontro de almas antigas que um dia celebraram
juntas e que hoje podem novamente celebrar. E para muitos, de lugares
distantes, isso só é possível graças à modernidade e à tecnologia!
Sendo assim, um treinamento à
distância é possível, mas existem limites para esse procedimento, pois o
convívio, o vínculo, o amor, a cumplicidade e a construção energética de uma
relação ao ponto de chamar outra pessoa de irmão, de filho – ou seja de que a
outra pessoa faça parte de sua família – é uma lenta construção.
É muito comum que as pessoas que
desejam fazer parte de um grupo tendam a dizer que amam as pessoas daquele
grupo, sem que isso seja real. Da mesma forma, é bastante comum que as pessoas
queiram ver seus grupos crescer, ascender e se tornar grandes grupos,
famosos... Isso é uma questão de ego que parece, inclusive, ir de encontro com
a ideia de que a Bruxaria jamais foi uma espécie de religiosidade de massas.. E
a internet, por ser uma ferramenta de disseminação, de promoção de encontros
excepcionais, serve a esses propósitos, gerando uma banalização da ideia de
família espiritual, de vínculo espiritual entre mestre e discípulo... Contudo,
de forma alguma a internet substitui o contato olho no olho, a prática
conjunta, o abraço.
Talvez cheguemos a um ponto em
que esses questionamentos sejam desprezados. Talvez já hoje, enquanto você lê
este artigo, sua opinião sobre o assunto seja diversa do que escrevi. São as
transformações, os ciclos da vida... Mas, para mim, embora eu tenha amigos
queridíssimos on line, no meu trilhar e na minha família espiritual, só faz
parte aquele que sai da tela do computador e me abraça sinceramente e comigo
comunga no moderno caminho dos Antigos Deuses.
6 comentários:
ótima postagem!
Lua, adoro seus textos, mas vou falar esse me deixou com o coração na mão :( entendi sua posição e tive que concordar com vários pontos (na verdade já pensava assim), mas como esse estudo a distancia é exatamente meu caso não pude deixar de me sentir "estranha".
Obrigada, meninas!
Kalinka, eu acho que esse assunto dá bastante pano para a manga. Até onde podemos ir, não é mesmo?
Acho que precisamos ter uma visão crítica das coisas.Não desmereço o estudo á distância, mas não creio que a noção de família possa se estabelecer sem o contato físico. Como eu disse, pode ser que um dia esse tipo de questionamento seja superado.Aliás, creio que seja bem possível disso acontecer. Faz parte. Porém, no meu sentir é muito sério falar que se é irmão de Arte de alguém, que se é mãe de Arte de alguém. E para mim tudo isso se constrói lentamente... e tem que ter o olho no olho, sabe? Tenho dedicados e até uma iniciada de longe. Moro em Taubaté e a Josy (minha iniciada) é de Campinas, o Bruno é de São Paulo, a Mel de Volta Redonda. Fazemos muitas coisas pena net... Mas não ritos, desenvolvimento espiritual, acompanhamento e tudo mais que envolve esse construir de um laço iniciático... ah, para mim tem que ter contato físico,olho no olho, mão dada.
E eu tenho absoluta certeza que todos que vivenciam a Arte no olho no olho preferem isso ao face e skype.
Porém... vai da necessidade... Nem sempre é possível, né?
Mas quem sabe essa fase de estudo à distância seja uma fase para vc, né?!
Pq não?
Não se sinta estranha. Faz parte da vida moderna de uma bruxa.
bj
<3
Acho que o problema é esse sou uma bruxa moderna "antiga" rsrs, mesmo minha orientadora sempre diz algo parecido, que não tem como ser igual ao vivo e a distancia, eu sinto muita falta do contato tbm. Mas sim, no meu caso é a situação atual e o que tenho no momento, mas é momentâneo tbm, isso minha intuição me diz. Obrigada Lua Serena, sempre fofa e atenciosa em responder.
Bem, na prática, até com relação a energia compartilhada, o cara-a-cara se faz necessário. Não desmereço orientações pela internet, mas a ligação necessário ao grupo, "sorry" até então se mostra importante ao vivo.
Agora, nada impede disso acontecer pela net. Como você mesma disse em seu texto, e é verdade, as bruxas e outros praticantes de magia sempre estiveram a frente de seu tempo. Nada impede de novas formas serem desenvolvidas.
Eu concordo, Magnus!
E acho, inclusive, que,de repente, com algumas pessoas talvez isso venha a funcionar... a forma de pensar e de viver humana vai se moldando e mudando constantemente. HOJE e para mim vínculos familiares espirituais e iniciáticos só ao vivo, a cores e com o tempo. Se constrói devagarinho... no dia a dia e no olho no olho. :)
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